28.12.10
Dioniso
27.12.10
Estranhamento
Formalismo e Recepção: Procedimentos para estranhar a imagem poética
Proposição formulada por Victor Chkolovsky foi retomada por Brecht para a formulação dos procedimentos de trabalho do ator. A perspectiva dialética por ele indicada com o estranhamento ou efeito V (Verfremdungseffekt)
Mauro R. Rodrigues
Professor Doutor Adjunto - Universidade Estadual de Londrina - Pr
(Publicado no V Congresso Brasileiro de Pesquisa e Pós-Graduação em Artes Cênicas)
Resumo
Breves apontamentos a respeito da teoria estética formalista proposta por Victor Chklovsky permitem revisar algumas das concepções críticas da teoria da arte que abordaram o receptor, do ponto de vista do papel desempenhado por ele no processo artístico. Preocupação esta que percorre variadas vertentes críticas, no século XX. Revisitadas permitirão formular anotações sobre questões pertinentes à interação de sentidos entre obra e recepção. A pretensão é atualizar alguns elementos neste vasto território conceitual, demarcando princípios tais como objeto estético, desfamiliarização, procedimento e materialidade que circundam a questão da imagem poética.
Palavras-chave: Teoria Estética; Recepção; Formalismo Russo.
And the Raven, never flitting, still is sitting, still is sitting
On the palid bust of Pallas just above my chamber door;
(Allan Poe)
Inúmeras vertentes da teoria da arte, no século XX, incumbiram-se da tarefa de demarcar papéis específicos ou gerais desempenhados pelo público, no amplo território das práticas artísticas e recepção. A voz de Chklovsky ecoa entre os formalistas russos, desde 1917, ressoando de modo determinante nos estudos da literatura. Repensa a multiplicidade das operações poéticas, complexas relações do receptor, no consumo e na consumação da obra de arte.
No artigo A
Ressalta ser a
A materialidade organiza-se, na obra de arte, como linguagem. Isto é, sob um modo específico de organização ou arranjo das matérias que permitirá a um receptor deste objeto formado encadeá-lo a uma série de contextos sociais, biográficos, psicológicos, ideológicos ou outros. A experiência estética dá-se, assim, a partir do reconhecimento e da organização da matéria empregada no objeto, associando-os a sistemas de sentidos. É o arranjo específico, sob certos procedimentos de construção, o que permite efetivar qual a experiência estética que tal objeto predispõe. O objeto ganhará sentido estético, trabalho sim da inteligência do artista, tão só exposto ao processo dinâmico, complexo, e de sua finalidade última, que é o da atribuição de valores a ele pelos seus receptores. Isto destacada o conhecimento artístico do conhecimento filosófico e científico.
Para
Os formalistas criticam a idéia de a arte ou a estética serem tomadas como reconhecimento apenas da pregnância simbólica da imagem. Partem da premissa de que o destaque dado à percepção da imagem, e não à organização da materialidade que a compõe, sedimentou-se na consciência dos estudiosos e
Para Chklovsky[2], as
O
Conhecer os modos empregados para a feitura da obra permite registrar a inteligência das articulações e os elementos que propriamente serviram à experiência do artista e, para o receptor, abrirá um jogo que lhe permitirá atribuir novos sentidos àquela reunião de elementos. E aqui se delineia uma definição das tarefas do receptor: conhecer o material da feitura, de como e de quais meios foram empregados para concretizar certa
O reconhecimento formal proposto pelos críticos russos e eslavos que se debruçaram sobre a questão da especificidade da obra e experiência com finalidade estética, no ínício do Século XX, contrapõe-se à idéia de ser a recepção mera identificação. Segundo Chklovsky, experiência estética engloba um
O reconhecimento formal proposto por Chklovsky salta sobre as operações retóricas, revelando-as ineficientes ou limitadas, uma vez elas aproximarem duas
O procedimento da composição, para Chklovsky,
O
A
O
A operação poética, nestes ecos que nos chegam da modernidade estética, pela voz de Chklovsky e dos conceitos que fundam o pensamento crítico contemporâneo, parecem reclamar uma modificação relevante no status da autoria da obra de arte. O papel de co-elaborador, co-participante e de a experiência estética ir mais além da atividade individual, reclama o conhecimento operativo, a inteligência e a sensibilidade do artista, tanto quanto requer e mobiliza o papel que desempenha aí o receptor.
A estética moderna move-se em direções as mais variadas. Rumo a novos programas de ação. Rumo à provocação. Rumo à produção de conhecimentos especificamente artísticos e estéticos. Mobiliza um novo pensamento e um novo lugar para as artes e faz o mesmo para os espectadores. A obra faz-se a partir de um jogo de parcerias e de encontros que consumam a obra com um novo modo de existir.
A renovação da crítica de arte, no século XX, legou-nos este inquietante conceito que é o de a arte ser uma provocação, empregando meios para nos desfamiliarizar com materilidade do mundo. Não apenas se afirma a arte e a experiência estética, mas a possibilidade de conhecermos e de criamos novos conceitos de arte, como se contextualiza a obra e o trabalho do artista, não sem deixar de estranhar as experiências que dizem respeito ao receptor e à participação dele na dinâmica da experiência estética. A nova crítica aponta os sistemas aos quais a materialidade está submetida ao processo artístico, suscita sassim as atividades do espectador. E, então, possibilita repensarmos o que é em nós mesmos e no mundo que nos causa estranheza e nos faz tornar um objeto em objeto estético.
Facto
Outono tom
Outono angular, sem chuvas brandas, de nuvens ébrias e ventos ímpios. Circunspecto o tempo. Senhoras do mundo a varrer toda mancha, a tintar os dias de chumbo e violeta.
Cai a tarde sem estrondo ou arroubo, o sol se nubla à Francis Bacon. As imagens fantasmagóricas, desenhos sobre o tapete descarnado das terras em campos desnudados e são os grãos grávidos da vida latente. O céu de terracota. Os pássaros em agonia, antes de deixarem morrer nas espigas os últimos grãos da fértil estação passada. Choram os pássaros em desespero de finada primavera. Não haverá pétalas noturnas a brilhar sobre as ramas, apenas as folhas da manhã. Intactas estarão as nossas asas. Os edifícios, as casas e ruas estarão às voltas com as névoas de rios subterrâneos exudados do breu da noite. Não se vêem e nem sabem existir no outono os nossos rubores . Qual paisagem de cidade em porcelana é esta aqui.
Hoje singular.
Apelo às poções
Na derrisão das vinhas,
Algibeira ao mundo,
Campeio longas distâncias.
Devasso em rodas
A derrisão das vinhas,
Esmagar o tempo
Colecionar essas pedras.