3.8.09

Um conto curto e quase árido

*




De tal modo atormentado, brigava até com o seu melhor amigo, mesmo este sendo o amigo imaginário.
Naufragou em sólida realidade que jamais se reconciliara.














*

2.8.09

Sereno Jeito!

Eu gosto, sobremaneira, de alguns sonetos.


Torpe, lembro-me, vago, alguns.


Cenas nasceram aí, fizeram-se épocas de muito refletir, das quais guardo mais que lembranças.


Posto que ali eu vejo os dias que morrem em crepúsculos fantásticos, afrontando-se o firmamento em algum alento de fim, e eu volto amanhã, este tempo é tempo de despertar sempre ao leito, com cara de amarfanhado, surpreso em alento para os perceptos.


Disto de todos o verbos, de todos os alheios afetos.




Nem dias ou mares de horas lavam prantos e ridos além de ausências do seu caráter;
roubou-me um instante a consciência,
fez latente, nem formosa, nem trágica,
alguma porta do meu peito.




Seus esforços mortos







"Meu coração tem um sereno jeito,
E as minhas mãos, o golpe duro e presto,
De tal maneira que, depois de feito,
Desencontrado, eu mesmo me contesto.
Se trago as mãos distantes do meu peito,
É que há distância entre a intenção e o gesto;
E se o meu coração nas mãos estreito,
Me assombra a súbita impressão de incesto.
Quando me encontro no calor da luta,
Ostento a aguda empunhadura à proa,
Mas meu peito se desabotoa;
E se a sentença se anuncia bruta,
Mais que depressa a mão, cega, executa,
Pois que senão o coração perdoa..."
(de "Calabar, o elogio da traição", de Chico Buarque")

1.8.09

Meia Noite Inteira

*
É! Parece que tem duas faces. Uma é grave. A outra aguda, solene! Ambas fazem equilíbrio? Olhos graves, ora agudos, assim olhamos. Vemos partes. Bacana se mesclam ou se misturam, quase se (con-)fundem... Então quase chegamos a ver.
Caraca, onde você acha isto? Com certeza! Massa isso!
Na maior parte do tempo pensamos ver... Não vemos...
Será que vemos?
Vez ou outra, vemos sim, noutras, imaginamos ver.
Chato isso. Ou talvez não. Mas seria bom poder ver mais. Mas mesclar nem sempre está em nós...
Vez ou outra, para ver mais e melhor, empresto uns olhos alheios: eu leio, busco filmes, escuto as palavras e sons que amigos ou desconhecidos fazem a respeito do sutil e do rude na e da vida. Em busca de olhos que suspeitem para além do mesmo que vejo, se é que eu vejo. Aprendo sobre o olhar... Sempre aprendiz!
Entendi! Somos muito fracos. Incapazes no que diz respeito ao sutil. Sobre o bruto temos mais experiências, conhecemos mais. Isso é natural(?). Acontece! Ai está a graça da sutileza.
Somos brutos, estúpidos, grosseiros, mas também sutis, sensíveis, habilidosos... Equilíbrio! Somos as duas partes... Mas poucos, e bem poucos, prestam atenção naquele outro lado do espelho... Naquele lado da lua... Na rua de duas pistas, duas mãos... e na vida que tem a contraparte que é a morte. Ambas nos acompanham... A sombra e a luz... A prata que reveste o vidro frio, que reflete a luz da existência que é fininha, fininha e quebra a qualquer momento.
É, somos humanos, né, gatão?! E isto me arrepia.
Isso está em nós: limites!
Quase sempre!
Sim...
Vez ou outra somos apenas animais, sem sermos humanos.
É, somos sim limitados e não é apenas no nosso ver e no nosso saber, nossa visãoe compreensão.
Um beijo em meio a um abraço, apagaria o seu limite humano, gatão?
Vem!
*

30.7.09

Desvão

*

Diz das impossibilidades e os ilimitados espaços que o sentimento ocupa. Então mente! Pois é tolo, torpe, se sentir é geral, inespecífico. Depois de embriagada a sensação, conforto, é a desrazão e o desejo que fazem naufragos dos cinco aos cinco milhões de nossos sentidos. Daí a atenção redobrada! Ou o cuidado de si!


*

11.7.09

Olvidar!

*





Disse-me que estar aqui seria sem igual. Então eu vim! E disse-me que haveria de aqui presenciar a manifestação do incognoscível, na dança sutil de sopros, fluxos, nos movimentos e nos implacáveis limites de tempo e espaço. Contou-me com entusiasmo sobre o casamento alquímico, a dizer-me que o infinito em algum parte liga-se ao finito.
E houve luz para os meus olhos, que são sempre os olhos de um outro, para vir aqui. E o manancial secreto da luz fez-se nas janelas do nascer, a jorrar águas que lavam os meus dias. Transbordou a percepção e nos faz rir da parca compreensão nossa, de ser a sua imagem metáfora vazia, mas indelével.
Uma vida em imagens que se conta a si, ainda mais sutil que a forma ou a cor. Brota no campo ou território do imaginário, até mesmo enquanto é imagem, quimera, criada na imagem do zero, o céu, as nuvens, o espaço, o interstício: imagens do nosso vazio.
A beleza não está exclusivamente nas coisas, não está nas cores, nem nas formas delas, nem nas imagens. Os olhos entregam a visão da beleza em cada detalhe e instante seus mesmo: aos olhos, se assim lhes (a)paracem!
E houve o manacial da visão a jorrar em todas as direções estas alegrias que são o sol e as sombras, todas!
Almofariz e forja a trabalhar, ruidosos e inquietos os olhos materlaram até que a imagem, sob o fogo dos nossos anseios, no passeio desses sobre a pele das coisas, reinventou a ventura da luz, emprestou a elas a vida que há em nós, em laços, nos vínculos que criamos com as coisas que nos tocam. Isso se elas nos tocam!





*

23.3.09

ouro a tolos

*
Creditasse ao tempo o futuro,

além da livre vontade,

daria ao presente a feição de um sombrio,

um leviano, um vazio.

Nas últimas noites de paisagens incríveis,

Pinto luzes na cheia lua

a revelar inusitadas as nuvens noturnas.

Tentativa de olhos para um passeio.

Dias e noites de descobertas

e promessas de invernos eternos



Era ouro de tolo, o previsível!

Exponho o além do tempo,

então desfeito, o que é o infinito?

*

pluma

*
Si, si!

Eu fui lá.

E há paraíso.
E não é ele artificial, nem real, mas é só paraíso.
E era Deus ausente.
Disseram-me que viajou,
sem data para o eterno retorno.
Deixou uns mapas desenhados nuns traços tão finos, tão sutis que não pude ver com os olhos de gente,
ao menos estes meus,
acostumados a grudar palavras ao que é tão só de olhar.

Os bichos, os petizes, quiçá, eles!
Poderão estes saber nas garatujas divinas setas que levam aos caminhos espontâneos
ao instante premente, a toda surpreza,
ao sorriso, este sim, o Grande Delírio
a nos restar diante e dentro
da beleza que é este mundo.
E sem as legendas,
que estão também em língua esquecida,
sobrou-me o espanto e algumas lágrimas,
sentindo o agradecimento por nada,
de ter estes meus olhos,
que ainda cansados,
puderam trazer pra você
este muído e distraído instante
feito de fotos das nuvens
plantadas nos caminhos dos céus.
*

Verdes os olhos da verdade

"o que é um espelho? Não existe a palavra espelho, só existem espelhos, pois um único é uma infinidade de espelhos (...) Quem olha um espelho, quem consegue vê-lo sem se ver, quem entende que a sua profundidade consiste em ele ser vazio, quem caminha para dentro de seu espaço transparente sem deixar nele o vestígio da própria imagem- esse alguém então percebeu o seu mistério de coisa"

(Clarisse Lispector. Água Viva, p. 94)

ser em si!

*
Onde vou,
Onde sigo,
Eu assunto.
Se eu trafego,
Se eu destino,
Se eu rota e aurora,
Se eu boreal,
Se eu ali,
Se eu lá,
Se eu estou a ir,
Se eu deveras,
Se eu o mesmo,
Se eu estou
Se eu e você
Se eu além,
Se eu rumo
Se eu a esmo,
Ss eu vou
Se sempre
Se sempre será sem fim.
*

Diga-me cloWN quem

Diga-me com quem andas
e como andas
E te direi se vou contigo!!!

Você aprecia?:
A. ( ) etilismo noturno
A. 1. ( ) estilismo soturno
A. 1. a ( ) alcoolismo diuturno
A. 1. ah ( ) ah! ah! haverá!

Deixa aqui a sua mensagem!

22.3.09

e eram eras

*
o fez-se o som
e o corpo do menino
arrastou
uns fluxos,
uns lances
e deu-se o móvil
fez-se a dança
no corpo dele
o chão
o ar
e era um ritmo
dois e a alegria,
mas era um corpo
e era um menino
e foi isto quase ali
e quase muito lindo

*

30.6.08

Filigranas de Rembrandt

*



Estive às voltas com filmes que não me agradaram.
No teatro, duas obras, ambas insignificantes... carentes de toda sorte de precisão: da luz à sombra. Eu tentei.
E vi esta tarde três ou quatro Rembrandts (1606-1669).
A semana redime-se aqui.

Tenho os olhos cheios da mais tênue luz a escorrer sobre tudo o que me toca.
Detive-me por horas, diante das poucas imagens. E senti necessidade de retornar a elas mais uma e outra vez.


A Holanda dele fascina.

Demorei-me tempo bastante diante das obras para saber a paixão.

As linhas ali se retorcem, contornam e vagueiam sobre a fibra do tecido. São voltas e, interrompendo-se, sofrem pulsões, forças. São filigranas de um mundo de desrazões e razões. Nôa há linhas a contornar as formas. Há luminescências que brotam do negro/escuro/claro amarelado e dourado. Escrituras de manchas na superfície da pele da pintura... Delicadezas de mãos do artista, enxugadas nas fibras de cada imagem; adivinha-se um fio de suor e genialidade ali.

Filigranas de Rembrandt fazem ver olhos escondidos nas imagens. É a pintura que me olha com olhares de um mundo em linhas de fuga, olhos esfumados e de intensas e profundas e distantes e próximas luzes esmaecidas. As transversais e as rotas de fuga, mundos em abismos, revolta, escarpas, penhasco.

Ílinx! Vertigem dos sentidos.

Philosopher in Meditation

Jogos de armar nos negros de fumo, nas graxas, no malsão carvão, nestas nuvens de cinzas.

Os amarelos abrazam para além das figuras, incendiam à bastança a secura que há lá; às vezes, num destes instantes, períodos em que o cotidiano se faz brazil. Brotam amarelos e ferrugens das terras ali, de onde não se suspeita infinitas paisagens de areias e pedras, aliás, que jamais se mostram nas obras que eu visitei. O amarelo delas é o deserto e a impessoalidade, um convite à intimidade, à penumbra, à alcova em Delft. Não haverá céu com luz amarelada e clara na Holanda? Haverá este sol de pintura que Rembandt contrói e faz tudo ressecar à luz dele? A pintura dele é lume.

Linha e plano em Rembrandt confundem a profundidade. Escorrem da realidade o óleo quente e a tela. Derretem-se as outras imagens. Não, não há nada ali de surreal. É mesmo o substrato do real, a melhor abstração sobre ele: o real inventado pela inteligência do pintor que se mão, que se obra. Presentifica e não mostra, não apresenta, mas faz existir. A profundidade está ali, no plano do tecido. E não existe profundidade.
Reinventam-se os meus olhos, a imaginar um mundo de sombras e luzes.
A pele desta pintura é mais funda, aprofunda a plana superfície das telas. Caleidoscópio!
Demasiado na pintura deste holandês não parece existir. Nem há calma. Nem tempestades. Quiçá, mistérios!

Reinvento e descrevo. Não, a pintura dele. Ela se basta e se ilustra, embora não se descreva. Presentifica-se, já disse. Quem se recria ali, diante dela, sou eu.

Artista engana.
Artista não finge ou vacila.
Precipita-se!
O desenho de Rembrandt refez um caminho para este meu dia.
O desenho dele, um pensar co'as mãos, pincéis e infinidades que possam haver nos olhos.

Evohé!



*

26.4.08

Bonecos que "respiram" em cena

Teatro Imago estréia temporada do espetáculo Vis MOtriX




Uma arte em que os atores emprestam sua respiração a objetos inanimados, uma arte em que bonecos feitos de espuma adquirem gestualidade, enternecendo o público com a expressão dos desejos e das emoções. Esta é a essência do espetáculo Vis MOtriX que o Teatro Imago estréia nesta quinta-feira (24), no Teatro Zaqueu de Mello, em Londrina, abrindo a temporada que vai se estender até outubro. No Vis MOtriX, os bonecos ganham movimentos humanos, mostram o quanto a poesia está presente nas cenas da vida que, pela magia do teatro, se transformam numa arte de encher os olhos. Bonecos que jogam bola, varrem, andam na corda-bamba, dançam e passeiam com guarda-chuvas são passaportes para o lirismo de uma linguagem única: a da animação, construída a partir de ações sincronizadas num trabalho que exige do elenco uma grande sintonia.

Baseado nas técnicas do Bunraku - teatro de animação japonês, sem falas, com narrativas musicais e manipulação de bonecos - o trabalho desenvolvido pelo Imago envolve vários desafios. Se no palco o público vê se desenrolar a ação das marionetes que, além de corpo, parecem ter alma, nos ensaios a atuação competente dos atores pode ser observada em ações que imprimem ao jogo cênico “vida aos bonecos”, uma vida que se alimenta do imaginário: tanto dos artistas quanto do público. São os atores, imperceptíveis no palco porque atuam em fundo escuro e vestidos de negro, que comandam as ações e as “emoções” dos bonecos, rindo ou entristecendo como se fossem seus próprios corpos em cena. Estas ações são transmitidas à platéia que, naturalmente, preenche a espetáculo com seu próprio repertório de conhecimento e sentimentos. Difícil é ficar indiferente à bagagem mágica que atinge quem está dentro e fora do palco.

Espetáculo: Vis MOtriX, com o Imago Teatro de Animação
Direção: Mauro Rodrigues
Local: Teatro Zaqueu de Mello (Av. Rio de Janeiro, 413, Londrina)
Sessões: quinta e sexta-feira (24 e 25), às 14h30, para alunos do Ensino Fundamental
Para o público e geral:

Sábado (26) às 20h

Domingo (27), às 20h30
Ingressos: R$ 10,00 (inteira) e R$ 5,00 (meia), à venda no Shopping Royal Plaza, na loja Uzzi (2º andar)


Patrocínio: Promic – Programa Municipal de Incentivo à Cultura e Rede Cidadania; INESUL

Apoio: Universidade Estadual de Londrina - Departamento de Música e Teatro - Centro Acadêmico de Artes Cênicas - Sanepar - Caco Serf-Service - Loja UZZI

21.3.08

Dia Internacional da Marionete e do Teatro de Bonecos


Grupo de teatro de bonecos estréia em abril e está fazendo parcerias para o desenvolvimento de um projeto didático-pedagógico


21 de março é o Dia Internacional do Teatro de Bonecos, um gênero lúdico que volta a florescer em Londrina a partir do trabalho do Imago Teatro de Animação, dirigido por Mauro Rodrigues.

O grupo vai fazer em abril a pré-estréia do espetáculo Vis MOtriX, permanecendo em cartaz no Teatro Zaqueu de Melo até outubro, com apresentações que acontecem uma vez por mês, de quinta a domingo.


O espetáculo Vis MOtriX, nome que é uma alusão à força motora ou animadora dos corpos, leva ao palco o encanto dos bonecos e o trabalho meticuloso com as marionetes criadas pelo próprio grupo, que nasceu de um trabalho desenvolvido por alunos do curso de Artes Cênicas da UEL, sob a supervisão e direção de Mauro Rodrigues.

O projeto tem patrocínio do Programa Municipal de Incentivo à Cultura – PROMIC – e vai realizar parcerias com Instituições Educacionais, Secretaria de Educação e Cultura do Município, Rede da Cidadania e Vilas Culturais. Além das apresentações, o projeto foi concebido para que o grupo realize oficinas e jogos teatrais nas escolas públicas e privadas interessadas em trabalhar e ter contato com o “teatro vivo”.

Com uma agenda de apresentações já reservada para as escolas públicas durante a temporada, o grupo inicia na próxima segunda-feira (24 de de março) uma série de contatos com as escolas privadas na intenção de ampliar o circuito do espetáculo junto ao público, realizando ainda , com alunos e professores, um criterioso trabalho artístico e educacional que tem o teatro como ferramenta.

Segundo Mauro Rodrigues, a proposta didático-pedagógica é destinada a alunos que tem entre 7 e 17 anos do Ensino Fundamental e Médio. “Envolver a equipe escolar em projetos artísticos é uma maneira de estimular a circulação da produção cultural e oferecer um instrumento inteligente para a formação e a informação”, diz.

Escolas interessadas em participar do projeto podem contatar o grupo Imago Teatro de Animação pelo telefone 9136-6893 (Daniela). Visitas às escolas para apresentação do projeto e sugestão de parceria podem ser previamente agendadas.


E-Lectra Comunicação

Jornalistas responsáveis:
Célia Musilli e Jackeline Seglin

Fones de contato: 3338-2705 e 9901-8790

21.11.07

VAIDADE

*

VAIDADE
VAIDADE
VAIDADE
NEM TUDO É VAIDADE
NO DUOMO
TEIAS TECEM
URDIDURA
TESSITURA
TRAMA
PENDIDAS
NO TEMPO DO TEMPLO
URDE E TECE URBES
ORBES SIDERAIS
DOS ANTIGOS DEUSES PAGÃOS
ENTERRADOS SOB ESTAS BRANCAS
ENEGRECIDAS PAREDES LÁPIDES SECULARES
A JORRAR SOBRE A PRAÇA SENTIDOS DO CONSPÍCUO
VERBO... VERBO... VERBO...
DORME CÓSMICO
ACORDA HOMEM
DESPERTO
DESERTO
PERTO
DESENHADO NA ABÓBODA COLOSSAL
O CHORO DE PERVERSOS E RESSENTIDOS
ORA CHORAM CERA
ORA EXUDA A VERGONHA DO MÁRMORE
A RESISTIR, A DURAR, A GUARDAR, A REVESTIR.
GRENÁS ESSAS MISSAS EM TRAÇAS BORDADEIRAS DO TEMPO
NAS VESTES DAS VELHAS BEATAS
A RUIR SUAS SANTAS TETAS
ONDE A HUMANIDADE SEU LEITE BEBEU
HOJE APENAS BEBEM OS ABUTRES DE ANÉIA, PELERINES E CRUZES DE OURO
AS SANTAS PRETAS AUSENTES NESTES ALTARES
NAVE DOS OLHOS DO MUNDO
MORRERAM DESDENTADAS
NO PÁTIO DE ALGUMA ALDEIA
VISITADA PELA ANGÚISTIA DESTES VERMES
RASTEJANTES UM DIA COM SEUS OLHOS DE PIEDADE
VOZES DE POMBAS MOFAS,
SUBINDO DAS PAREDES ÀS SUAS VEIAS DE LEITE
DAQUI RETIRARAM A VIDA
PLANTARAM O SEU PRÓPRIO PECADO
ONDE NASCE ESTE SEPULCRO CATEDRAL
SEUS NICHOS DE POEIRA DE OLHOS VITRAIS DAS ANTIGAS DEUSAS
EMASCULADOS SEUS LÍRIOS VESTEM-SE AGORA NÉSCIOS
NEM PUROS, NEM ALVOS
SÃO APENAS CÍRIOS MUTILADOS
VAZADOS PELOS CANAIS DE VENTO
DAS FERIDAS QUE SOPRAM DO ORIENTE
NA PIEDADE DIVINA
NOS OLHOS ÁRABES
DESTAS DEUSAS NEGRAS TRAVESTIDAS CRISTÃS
IMPUGNAM-NOS À LIBERDADE
À SACRA CULPA EM BOCAS MIÚDAS COCHICHOS A MALDIZER
ROUBA-NOS O SILÊNCIO
AS ANTIGAS CATACUMBAS
DESFAZ-SE A NOSSA ALMA EM PÓ
VONTAREMOS AO SACRO OFÍCIO DO MÁRMORE
PINTADOS MENINOS
PUROS LEVES E FAMINTOS
SORRINDO NO SEPULCRO DAS ROCHAS POMBAS
CIRCUNDADOS OS ROSÁRIOS NA NOSSA GARGANTA
ENGOLINDO CONTA A CONTA DESTAS PÉROLAS ACRES
QUE ESCORREM DOS DEDOS DAS NOSSAS MÃES SEM ROSAS,
FIOS DAS FIBRAS DO NOSSO PEITO
FILAS DE CICATRIZES CRUZES
TECELÃS DE NOSSO SUDÁRIO
INÚTIL TAPAR ESTAS VERGONHAS
O CORPO NÚ DESTE HOMEM
NO CONFESSIONÁRIO DE PUNHAL
E ESPADA NO MAPA DA DESOLAÇÃO
NA LINHAGEM NOBRE DA NOSSA HUMANA SOLIDÃO
BEATAS ZIGUEZAGUEANTES NA NAVE CENTRAL
CORRENTES PÓLVORA AZUL-CHUMBO
TITUBEAIAM NOS CORREDORES DANTESCOS ENTRE GRADES
ARRASTAM-NOS CONSIGO PENSAMENTO, ATO E PALAVRA
OMISSÕES OMISSÕES OMISSÕES
O PADRE OLHA A BUNDA DAQUELES LINDOS MENINOS
HABITUADO HOMEM DE CULPAS ETERNAS
ELE VÊ QUE É VISTO POR UM DEUS PAGÃO
DAS ÓRBITAS RETIRA SEUS OLHOS
METE-OS NA CAIXA AO COLO
SEUS DEDOS DESFIAM E VASCULHAM A OBCENA CAIXA BÍBLIA,
TACITURNO INSTANTE EM QUE SEUS MISTÉRIOS
VOMITADOS PELSO OLHOS ESTE DEUS ENCONTROU
NO CORPO DESTA BATINA UM HOMEM NÚ E INGÊNUO,
LAMBIDO PELOS OLHOS SACROS
NOS DEGRAUS DESTA CATEDRAL
NO CONFESSIONÁRIO DA SUA CONSCIÊNCIA
ENRUBESCEU E SAIU
NA NAVE SOAM SONOROS ESTERTORES SENSÍVEIS
RESSOA O CANTOCHÃO
AS LADAINHAS
MELISMAS DAS DORES EM DESERTOS VERMELHOR, AZUIS E AMARELOS
VITRÔS, VITRAIS, VIDRILHOS
MANTOS DE POMBAS SALPICAM A PULCRA SANTA
SEUS OLHOS CRAVADOS EM ALGUM MISTÉRIO
RUBROS E ENCARNADOS
PÉS DEDOS BOCAS ASAS
SANGRAM SEM PULSAR
BRANCO MÁRMORE NEGRO
SANTAS POEIRENTAS
DOURADOS GUMES NAS SUAS COROAS
RECLAMAM A SAÍDA
ESCADAS ABAIXO ELAS OLHAM
PIEDOSAS,
INVEJOSAS
DAMO-LHES AS COSTAS
ESPELHOS DE TODOS OS OLHOS
VOSSAS SENHORAS DE NEGRO
DESEJOS DE HISTÓRIAS QUE CHORAM
SANGRA SOB O MATO DESTAS SANTAS
O CORPO DE HOMEM NÚ
SUADOS DE PARAFINA
CRAVEJADOS DE PEDRAS
BRILHANTES DESEJOS FERVILHAM NO SEU ESTANDARTE E NAS SUAS COROAS
TOCA A BOCA DO ESPELHO A BENTA AGUA
ESCORRE UM VALE DE LÁGRIMAS DE VELAS
CERA DE TODAS AS VAIDADES
DAS VAIDADES ESTA REZA
DA PIEDADE
É IDÊNTICA À IMAGEM DESTA OPALINA CATEDRAL NA CIDADE
INÚTIL COFRE DE DORES, TILINTA O NOBRE QUE COBRE SEUS OLHOS E CHORA AOS PÉS DO MENINO QUE GRITA SOCORRO NA FOME
ESPELHA ESTA LUZ DA RAZÃO
DE HAVER PLANTADA NESTA VELHA CIDADE
O MUNDO QUE BRILHA AOS RESTOS DE TODOS OS OSSOS
DO GREGO GOZO - DO ROMANO IMPÉRIO - DA DEVASTAÇÃO DAS AMÉRICAS - DA EXPLORAÇÃO DAS ÍNDIAS DO ORIENTE ATÉ ESTE OCIDENTE SEM PLEXO SOLAR
ERGUE-SE ELA IMPONENTE,
VITORIOSA VERTIGEM DE TODAS AS PRAÇAS DO MUNDO
ONDO SOAM OS SINOS NOS FINAL DAS TARDES
NESTE SÉCULO E MEIO DE LÁGRIMAS ESPALHADAS PELOS TURÍBULOS
EM MÃOS QUE NUNCA ASSENTARAM UMA PEDRA
NEM TUDO É APENAS VAIDADE
HÁ O PERVERSO, HÁ O CRUEL
QUASE TUDO VELEIDADE
E MERAS SÃO ESTAS PALAVRAS
A ESCORRER NUM CÁLICE OUVIDO TORPE
VERTIDAS NO ÁTRIO DESTE DUCTO DA INCONSCIÊNCIA
EM MERA VERTIGEM DA LÍNGUA
NUM BANCO DENTRO DO DUOMO EM MILÃO
EVOHÉ! EVOHÉ! EVOHÉ! EVOHÉ! EVOHÉ! EVOHÉ! EVOHÉ!
Milão, outubro 2005
Ao bom homem de coração pomba,
ao amigo Césare de Vitta
*







19.11.07

Escrevinhador de textos

*
Levante o sol um dia claro e Londrina amanhece em novembro, 2007




Eu temo pelo destino dos textos que ainda não escrevi.

*

Verbo derrisivo



*



AMAR


raiz de tantas experiências






AMARrar
AMARrotar
AMARgurar
AMARfanhar
AMARlotar
AMARotar
AMARelar
Derrisão desejável
a si ou a alguém?
*

20.10.07

Bicho de sete cabeças

*


Não dá pé, não tem pé nem cabeça
Não tem ninguém que mereça, não tem coração que

esqueça
Não tem jeito mesmo

Não tem dó no peito, não tem nem talvez
Ter feito o que você me fez, desapareça
Cresça e desapareça
Não tem dó no peito, não tem jeito
Não tem coração que esqueça, não tem ninguém que
mereça
Não tem pé, não tem cabeça
Não dá pé, não é direito
Não foi nada, eu não fiz nada disso e você fez um
Bicho de sete cabeças




Geraldo Azevedo

*